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A GALERIA
28 de novembro de 2012
As palmas de suas mãos forçavam-se contra o solo fazendo seu corpo subir e descer com o movimento forte das flexões de seus braços. Move-se tão rapidamente na horizontal que seu peitoral quase tocava o piso. Equilibrava-se nas pernas, cujo sustento provinha das pontas dos pés no tapete. A cada contagem, Dionísio prendia e soltava a respiração em sincronia com os complexos gestos de dobrar e esticar os braços. O grupo de homens a sua volta observava minuciosamente o processo e a exatidão de seus movimentos, fazendo o possível para manter o silêncio e não interferir na concentração do aluno.
– Quarenta e oito... quarenta e nove... cinquenta! – berrou Diego Santorini.
Todos os presentes balançam a cabeça em sinal de assentimento e alegria pelo sucesso do companheiro. Thomas Bruso gira a face para o lado, observa Thales e os dois sorriem um para o outro. Voltando-se para o jovem que fazia as flexões, diz satisfeito:
– Muito bom, Max Wolf! Está cada vez melhor, para quem não fazia nem vinte, evoluiu bastante.
Uma gota de suor desliza de sua testa e encontra o chão. Dionísio num impulso, com a força de seus músculos, lança o próprio corpo para cima e se levanta. Cansando e sentindo o calor aquecer suas entranhas, olha com gratidão para os mentores, respirando afoito, tentando recuperar o fôlego perdido.
– Obrigado, mestre Doutrinador, eu faço o que posso! – agradeceu ele parcialmente esgotado.
Thomas se dirige até o centro da sala, Thales faz o mesmo. Os dois ficam a examinar as fisionomias alegres dos pupilos. Passado o momento de suspense, Thales diz sério para a turma de ouvintes:
– Reúnam-se à minha frente !
Todos, acatando a ordem, dão alguns passos e permanecem próximos à dupla. Um dos rapazes se adianta, coloca-se perto dos mentores e pergunta:
– O que vamos ter agora?
Thomas leva o braço na direção do sujeito curioso e ergue a mão aberta, em sinal de calma. Diz paciente :
– Espere e verá!
O garoto recua e se mistura aos demais.
– Alinhem-se em fileiras de cinco! – coordenou Doutrinador (Thomas).
Seis filas de homens se formam diante do treinador de cabeça raspada, agrupando os trinta membros em divisões iguais.
Thales, junto ao primeiro tutor, joga os braços para o alto, dobra-os para trás da cabeça, entrelaça os pulsos e os prensam sobre a nuca. Em seguida, faz o grupo de jovens copiar seus movimentos.
– Fechem os olhos e não digam nada! – brandou Travis Bickle (Thales).
Ninguém mais era visto com os olhos abertos.
– Respirem fundo e pensem em todos os acontecimentos ruins de suas vidas! – disse Doutrinador.
– Estão sentindo os punhos forçados contra a nuca? Isso é simbólico, sinaliza toda a dor humana, nossos fracassos, nossas tristezas e nossos receios. Atentem-se sempre para essa parte de nossa mente! Pois, frequentemente as pessoas mal intencionadas costumam usar essas fraquezas contras nós para tentar nos derrubar. – falou Travis Bickel.
Dionísio tenta espiar.
– Não abram os olhos! – berrou Thomas com voz autoritária.
Assustando-se, Dionísio fecha ainda mais suas pálpebras.
– Inspirem levemente o ar apertando os pulsos contra a nuca! – ordenou Travis Bickle (Thales) com os olhos cerrados.
– Agora, soltem a respiração devagar, desencostando os braços da cabeça! Pensem em tudo o que os atrapalha e liberem, façam tudo desaparecer de seu subconsciente, deixando a mente totalmente livre! – comandou Doutrinador.
– Refaçam os movimentos, levantem calmamente os braços na sintonia da respiração mantendo os punhos unidos! Desçam as mãos calmamente até a altura da cintura, atenham-se a deixar a cabeça erguida! – finalizou Travis.
Os trinta repetem a ação em um movimento ritmado de inspiração e expiração.
– Abram os olhos! – ordenou o homem de cabeça raspada.
Imediatamente, todos os fitam com os olhos atentos. Thomas sorri, balança a cabeça e diz, pousando os olhos no grupo:
– Sempre façam isso antes das lutas, ajuda a liberar a carga emocional, deixa a mente limpa e nos ajuda a conciliar os movimentos de ataque com o raciocínio. É claro que não desejo nunca que usem o que aprenderam para lutas sem sentido. Mas, se um dia precisarem, bloqueiem a carga negativa da mente, pois o inimigo poderá usá-la contra vocês. Thales, após fazer um movimento de subir e descer o queixo em sinal de concordância, mira os alunos e dá a última ordem:
– Estão dispensados, o treino de hoje acabou!
O grupo se dissipa. Alguns vão ao banheiro se refrescar, os demais tomam outro rumo. Dionísio enxuga o rosto com sua toalha. Após tirar o suor do rosto, percorre os membros a sua volta e grita assim que encontra quem procurava:
– Cravo!
Em meio ao grupo de rapazes que tagarelavam amigavelmente, um rapaz alto, de pele morena, ergue um dos braços sinalizando para Dionísio.
– Max Wolf!
– Viu o Lawlyet hoje?
O membro bate a mão nos ombros de alguns dos companheiros, aperta a mão de outros e marcha na direção do amigo. De fronte a ele lhe, dá a resposta:
– Acredito que ele não veio hoje. Sempre o vejo na sessão de filosofia e estudos da mente humana. Passei lá pela manhã e ele não estava.
– Obrigado! E ai? Já vai embora? – perguntou Dionísio.
Cravo olha a sua volta e balança a cabeça em saudação aos mestres que se retiram.
– Não, mano. Vou ficar mais um pouco.
– Então vamos dar uma volta – convidou Dionísio.
– Claro – respondeu ele ao saírem do setor.
O dia estava quente, por isso, os ventiladores nos corredores estavam todos em funcionamento. No início, o barulho das hélices parecia irritante, mas com o tempo, todos foram se acostumando. Os becos estavam frescos e essa justificativa já bastava para deixá -los ligados. Muitos rapazes, a maioria com idades entre quinze e trinta anos, eram vistos transitando pelas passagens. A maior parte deles, ao se deparar com a dupla, leva a mão direita na direção do peito, deixando o dedo indicador e o dedo médio erguidos e os demais fechados, sinalizando um “V”. Em seguida, sorriem e balançam a cabeça. É o comprimento oficial, cuja função é demonstrar que um torce pela vitória do outro e que todos estão unidos por um bem comum, “a evolução mútua”. É normal todos agirem dessa forma ao se encontrarem nas passagens e aqueles que não o fazem, ou é por distração ou por estarem apressados. Dionísio e seu companheiro retribuem os gestos e seguem seu caminho.
O rapaz moreno fita Dionísio com certo receio e diz:
– Max Wolf, não se chateie comigo pelo que vou te perguntar... é que...
– Fale, pode dizer! – cortou Dionísio, andando calmamente.
– O marginal que morreu? Não deu nenhum problema para você e seus amigos? Pois, como fiquei sabendo, vocês todos estavam no local no dia do ocorrido – indagou Cravo, meio sem jeito. – Desculpe tocar nesse assunto, mas a cidade toda não para de comentar. E olha que já faz várias semanas que a tragédia aconteceu.
Dionísio o olha com surpresa, mas não se mostra incomodado com a pergunta. Sem temor algum, discorre sobre o referido episódio:
– Não tivemos culpa. Foi a namorada dele quem atirou sem querer. Mas... – Dionísio sorri ao se lembrar do episódio. – Foi graças a ele que recuperei a confiança e a amizade dos meus melhores amigos. Pelo menos uma vez, esse ordinário me foi útil.
– Não deve ser nada agradável ver uma cena dessas. – o companheiro falou.
– E não é mesmo... – entristeceu Dionísio.
Visando mudar de assunto, Max Wolf introduz outra pauta.
– Sabe, cara! Eu sempre achei engraçado o seu apelido. Por que você escolheu o nome Cravo? – perguntou conforme ia dando suas saudações.
Cravo dá uma ligeira gargalha e diz educadamente:
– No dia em que eu vim parar aqui, da mesma maneira que muitos outros, fiquei atordoado com tudo que vi. Eles me perguntaram qual seria meu codinome de identificação. Estava tão entusiasmado que disse o primeiro nome que me veio a cabeça. Cravo! Que é...
– desconfiado, olha à sua volta. Não vendo ninguém além do seu interrogador, continua em voz baixa – Meu nome é Lucas Pereira Cravo. Para ficar mais fácil, usei meu último nome. Dionísio sorri e continua o passeio. Lê as descrições nas portas e para bruscamente ao notar uma que lhe causa surpresa.
– O que foi, Max Wolf?
Dionísio pega na maçaneta e diz:
– História do Quartel? Cara, como nunca vi esse setor antes? Estou aqui há anos.
– Deve ter sido por descuido seu, Max! – Cravo ri – Também, há tantas portas aqui, que é difícil conhecer todos os setores.
Entusiasmado, Dionísio entra no local. Seu parceiro faz o mesmo. Havia cerca de dez pessoas rondando o ambiente. Pensou que iria encontra livros, mas não. Apenas quadros, itens antigos e fotos eram vistos. Todos os mestres tinham um quadro seu ali: Thomas, Thales, Silvio e alguns outros conselheiros e membros importantes. Acima do nome Nessahem, era vista uma silhueta escura, sua fisionomia era indistinguível.
– Por que o Nessahem não aparece nitidamente?
Cravo já se preparava para responder quando uma voz ecoa pelo salão.
– Ele pediu para não ser identificado, senhores! Temos de respeitar a vontade dele.
Os dois se voltam para o sujeito, era Sílvio Koren.
– Oi mestre, grande búfalo viril! – saudou Dionísio.
O homem de bengala assente com a cabeça.
Estuda a foto de todas as formas possíveis, aquela silhueta, o formato do rosto escurecido parecia-lhe familiar. No entanto, não conseguia associar sua imagem. Não tinha certeza, mas sentia que aquela foto não lhe era estranha. Caminha pelo lugar, vê objetos esquisitos, algemas de escravos penduradas na parede. Dionísio faz cara de estranheza ao vê-las. Deseja perguntar a Sílvio sobre tudo aquilo. O problema é que de nada iria adiantar, pois uma das primeiras regras que aprendeu, é a de que nada no quartel era de graça, tudo requer esforço e as informações não fugiam desse padrão. Se as quiser, terá de procurá-las por si mesmo. Muitos outros objetos desconhecidos também estavam naquele lugar. Embora as paredes sejam todas bem feitas, sentia-se um cheiro fresco, como se o ar estivesse úmido. Não havia água escorrendo pelas paredes, contudo, tinha a sensação de que havia um lago correndo à sua volta. Dionísio torna a mira os quadros.
– Ouvi falar que foi do Mestre Furher a ideia de por o quadro dos mestres aqui.
– Furher? – Dionísio pensa um pouco e se recorda – Ah, lembrei. É o tal mestre que enlouqueceu. Que estava internado no manicômio judiciário.
– Esse mesmo – disse Cravo.
Sílvio se entristece ao ouvir os dois se referirem a Ernesto.
Dionísio, ainda com a atenção fixa nos quadros, dá um giro e vê que um era o maior de todos eles. Diferente dos outros, esse aparentava ter mais de cem anos. Era a figura de um homem de mais ou menos sessenta anos, bigode longo e grosso cujas pontas grisalhas eram dobradas para cima. Usava trajes finos e antigos e tinha uma fisionomia respeitável.
– Quem será esse? – indagou Dionísio.
– Ele é o Barão de Januária – respondeu Cravo.
Dionísio o encara espantado.
– Por que o quadro dele é o maior de todos e mais antigo?
Sílvio Koren, com a ajuda do seu apoio, aproxima-se a passos lentos e responde: – Meu nobre amigo, Nessahem foi o grande idealizador do lugar, e o primeiro dos mestres, mas... – os dois o fitam com uma expressão de curiosidade
– Essas paredes, esse teto e toda essa arquitetura por detrás dessas pinturas e apetrechos tecnológicos, já existiam bem antes de todos nós aqui nascermos.
– Verdade? Que massa! – falou Dionísio com satisfação.
– Sim, seus paspalhos. Paro por aqui, se quiser aprender mais, procurem descobrir– disse o mestre.
Sílvio segue pela galeria deixando ambos para trás. A dupla volta a observar o quadro, ainda confusos. Dionísio, pensativo, reflete sobre quantos segredos o misterioso lugar guarda e sobre o longo tempo que levará para descobrir a origem dessa enorme propriedade escondida na velha estação ferroviária. Se entristece ao se dar conta de que, em breve, terá de se desligar do lugar e tomar o seu rumo na vida. Dirigi-se ao companheiro e diz com certo pesar:
– Acredito que o ano que vem seja o último que eu frequente aqui.
Cravo mira-o de súbito, com um semblante preocupado.
– Por quê? Irá se desligar do quartel? Esta com algum problema?
– Não – respondeu ele sem muito entusiasmo. – É que eu me formo no ano que vem. Um dos meus professores do curso de administração disse que se minhas notas continuarem altas, irá me indicar para uma das melhores universidades de pós-graduação da capital.
– Que bom, cara! – felicitou o rapaz.
– Espero que dê tudo certo! – suspirou Dionísio.
O rapaz coloca a mão sobre seu ombro e diz, esboçando alegria:
– Torço muito por você!
– Obrigado! – agradeceu Dionísio.
Outra vez presta atenção na imagem dos mestres na parede como se estivesse a pedir a opinião dos mesmos sobre o seu destino. Entretanto, sabia que a resposta somente ele era capaz de dar. Não sabendo se estava feliz ou triste com o seu retorno à cidade que, tempos atrás, fora seu ambiente de pesadelos, fica em silencio, submerso no seu dilema. Como será o reencontro com seus antigos colegas de colégio, agora que está totalmente mudado? Será mesmo que está apto a perdoá-los? Pensou sobre isso, mas, sem respostas.
( Semana que vem tem o segundo : "EPÍLOGO" )
Sabia que a venda dos livros impressos já voltaram?
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As palmas de suas mãos forçavam-se contra o solo fazendo seu corpo subir e descer com o movimento forte das flexões de seus braços. Move-se tão rapidamente na horizontal que seu peitoral quase tocava o piso. Equilibrava-se nas pernas, cujo sustento provinha das pontas dos pés no tapete. A cada contagem, Dionísio prendia e soltava a respiração em sincronia com os complexos gestos de dobrar e esticar os braços. O grupo de homens a sua volta observava minuciosamente o processo e a exatidão de seus movimentos, fazendo o possível para manter o silêncio e não interferir na concentração do aluno.
– Quarenta e oito... quarenta e nove... cinquenta! – berrou Diego Santorini.
Todos os presentes balançam a cabeça em sinal de assentimento e alegria pelo sucesso do companheiro. Thomas Bruso gira a face para o lado, observa Thales e os dois sorriem um para o outro. Voltando-se para o jovem que fazia as flexões, diz satisfeito:
– Muito bom, Max Wolf! Está cada vez melhor, para quem não fazia nem vinte, evoluiu bastante.
Uma gota de suor desliza de sua testa e encontra o chão. Dionísio num impulso, com a força de seus músculos, lança o próprio corpo para cima e se levanta. Cansando e sentindo o calor aquecer suas entranhas, olha com gratidão para os mentores, respirando afoito, tentando recuperar o fôlego perdido.
– Obrigado, mestre Doutrinador, eu faço o que posso! – agradeceu ele parcialmente esgotado.
Thomas se dirige até o centro da sala, Thales faz o mesmo. Os dois ficam a examinar as fisionomias alegres dos pupilos. Passado o momento de suspense, Thales diz sério para a turma de ouvintes:
– Reúnam-se à minha frente !
Todos, acatando a ordem, dão alguns passos e permanecem próximos à dupla. Um dos rapazes se adianta, coloca-se perto dos mentores e pergunta:
– O que vamos ter agora?
Thomas leva o braço na direção do sujeito curioso e ergue a mão aberta, em sinal de calma. Diz paciente :
– Espere e verá!
O garoto recua e se mistura aos demais.
– Alinhem-se em fileiras de cinco! – coordenou Doutrinador (Thomas).
Seis filas de homens se formam diante do treinador de cabeça raspada, agrupando os trinta membros em divisões iguais.
Thales, junto ao primeiro tutor, joga os braços para o alto, dobra-os para trás da cabeça, entrelaça os pulsos e os prensam sobre a nuca. Em seguida, faz o grupo de jovens copiar seus movimentos.
– Fechem os olhos e não digam nada! – brandou Travis Bickle (Thales).
Ninguém mais era visto com os olhos abertos.
– Respirem fundo e pensem em todos os acontecimentos ruins de suas vidas! – disse Doutrinador.
– Estão sentindo os punhos forçados contra a nuca? Isso é simbólico, sinaliza toda a dor humana, nossos fracassos, nossas tristezas e nossos receios. Atentem-se sempre para essa parte de nossa mente! Pois, frequentemente as pessoas mal intencionadas costumam usar essas fraquezas contras nós para tentar nos derrubar. – falou Travis Bickel.
Dionísio tenta espiar.
– Não abram os olhos! – berrou Thomas com voz autoritária.
Assustando-se, Dionísio fecha ainda mais suas pálpebras.
– Inspirem levemente o ar apertando os pulsos contra a nuca! – ordenou Travis Bickle (Thales) com os olhos cerrados.
– Agora, soltem a respiração devagar, desencostando os braços da cabeça! Pensem em tudo o que os atrapalha e liberem, façam tudo desaparecer de seu subconsciente, deixando a mente totalmente livre! – comandou Doutrinador.
– Refaçam os movimentos, levantem calmamente os braços na sintonia da respiração mantendo os punhos unidos! Desçam as mãos calmamente até a altura da cintura, atenham-se a deixar a cabeça erguida! – finalizou Travis.
Os trinta repetem a ação em um movimento ritmado de inspiração e expiração.
– Abram os olhos! – ordenou o homem de cabeça raspada.
Imediatamente, todos os fitam com os olhos atentos. Thomas sorri, balança a cabeça e diz, pousando os olhos no grupo:
– Sempre façam isso antes das lutas, ajuda a liberar a carga emocional, deixa a mente limpa e nos ajuda a conciliar os movimentos de ataque com o raciocínio. É claro que não desejo nunca que usem o que aprenderam para lutas sem sentido. Mas, se um dia precisarem, bloqueiem a carga negativa da mente, pois o inimigo poderá usá-la contra vocês. Thales, após fazer um movimento de subir e descer o queixo em sinal de concordância, mira os alunos e dá a última ordem:
– Estão dispensados, o treino de hoje acabou!
O grupo se dissipa. Alguns vão ao banheiro se refrescar, os demais tomam outro rumo. Dionísio enxuga o rosto com sua toalha. Após tirar o suor do rosto, percorre os membros a sua volta e grita assim que encontra quem procurava:
– Cravo!
Em meio ao grupo de rapazes que tagarelavam amigavelmente, um rapaz alto, de pele morena, ergue um dos braços sinalizando para Dionísio.
– Max Wolf!
– Viu o Lawlyet hoje?
O membro bate a mão nos ombros de alguns dos companheiros, aperta a mão de outros e marcha na direção do amigo. De fronte a ele lhe, dá a resposta:
– Acredito que ele não veio hoje. Sempre o vejo na sessão de filosofia e estudos da mente humana. Passei lá pela manhã e ele não estava.
– Obrigado! E ai? Já vai embora? – perguntou Dionísio.
Cravo olha a sua volta e balança a cabeça em saudação aos mestres que se retiram.
– Não, mano. Vou ficar mais um pouco.
– Então vamos dar uma volta – convidou Dionísio.
– Claro – respondeu ele ao saírem do setor.
O dia estava quente, por isso, os ventiladores nos corredores estavam todos em funcionamento. No início, o barulho das hélices parecia irritante, mas com o tempo, todos foram se acostumando. Os becos estavam frescos e essa justificativa já bastava para deixá -los ligados. Muitos rapazes, a maioria com idades entre quinze e trinta anos, eram vistos transitando pelas passagens. A maior parte deles, ao se deparar com a dupla, leva a mão direita na direção do peito, deixando o dedo indicador e o dedo médio erguidos e os demais fechados, sinalizando um “V”. Em seguida, sorriem e balançam a cabeça. É o comprimento oficial, cuja função é demonstrar que um torce pela vitória do outro e que todos estão unidos por um bem comum, “a evolução mútua”. É normal todos agirem dessa forma ao se encontrarem nas passagens e aqueles que não o fazem, ou é por distração ou por estarem apressados. Dionísio e seu companheiro retribuem os gestos e seguem seu caminho.
O rapaz moreno fita Dionísio com certo receio e diz:
– Max Wolf, não se chateie comigo pelo que vou te perguntar... é que...
– Fale, pode dizer! – cortou Dionísio, andando calmamente.
– O marginal que morreu? Não deu nenhum problema para você e seus amigos? Pois, como fiquei sabendo, vocês todos estavam no local no dia do ocorrido – indagou Cravo, meio sem jeito. – Desculpe tocar nesse assunto, mas a cidade toda não para de comentar. E olha que já faz várias semanas que a tragédia aconteceu.
Dionísio o olha com surpresa, mas não se mostra incomodado com a pergunta. Sem temor algum, discorre sobre o referido episódio:
– Não tivemos culpa. Foi a namorada dele quem atirou sem querer. Mas... – Dionísio sorri ao se lembrar do episódio. – Foi graças a ele que recuperei a confiança e a amizade dos meus melhores amigos. Pelo menos uma vez, esse ordinário me foi útil.
– Não deve ser nada agradável ver uma cena dessas. – o companheiro falou.
– E não é mesmo... – entristeceu Dionísio.
Visando mudar de assunto, Max Wolf introduz outra pauta.
– Sabe, cara! Eu sempre achei engraçado o seu apelido. Por que você escolheu o nome Cravo? – perguntou conforme ia dando suas saudações.
Cravo dá uma ligeira gargalha e diz educadamente:
– No dia em que eu vim parar aqui, da mesma maneira que muitos outros, fiquei atordoado com tudo que vi. Eles me perguntaram qual seria meu codinome de identificação. Estava tão entusiasmado que disse o primeiro nome que me veio a cabeça. Cravo! Que é...
– desconfiado, olha à sua volta. Não vendo ninguém além do seu interrogador, continua em voz baixa – Meu nome é Lucas Pereira Cravo. Para ficar mais fácil, usei meu último nome. Dionísio sorri e continua o passeio. Lê as descrições nas portas e para bruscamente ao notar uma que lhe causa surpresa.
– O que foi, Max Wolf?
Dionísio pega na maçaneta e diz:
– História do Quartel? Cara, como nunca vi esse setor antes? Estou aqui há anos.
– Deve ter sido por descuido seu, Max! – Cravo ri – Também, há tantas portas aqui, que é difícil conhecer todos os setores.
Entusiasmado, Dionísio entra no local. Seu parceiro faz o mesmo. Havia cerca de dez pessoas rondando o ambiente. Pensou que iria encontra livros, mas não. Apenas quadros, itens antigos e fotos eram vistos. Todos os mestres tinham um quadro seu ali: Thomas, Thales, Silvio e alguns outros conselheiros e membros importantes. Acima do nome Nessahem, era vista uma silhueta escura, sua fisionomia era indistinguível.
– Por que o Nessahem não aparece nitidamente?
Cravo já se preparava para responder quando uma voz ecoa pelo salão.
– Ele pediu para não ser identificado, senhores! Temos de respeitar a vontade dele.
Os dois se voltam para o sujeito, era Sílvio Koren.
– Oi mestre, grande búfalo viril! – saudou Dionísio.
O homem de bengala assente com a cabeça.
Estuda a foto de todas as formas possíveis, aquela silhueta, o formato do rosto escurecido parecia-lhe familiar. No entanto, não conseguia associar sua imagem. Não tinha certeza, mas sentia que aquela foto não lhe era estranha. Caminha pelo lugar, vê objetos esquisitos, algemas de escravos penduradas na parede. Dionísio faz cara de estranheza ao vê-las. Deseja perguntar a Sílvio sobre tudo aquilo. O problema é que de nada iria adiantar, pois uma das primeiras regras que aprendeu, é a de que nada no quartel era de graça, tudo requer esforço e as informações não fugiam desse padrão. Se as quiser, terá de procurá-las por si mesmo. Muitos outros objetos desconhecidos também estavam naquele lugar. Embora as paredes sejam todas bem feitas, sentia-se um cheiro fresco, como se o ar estivesse úmido. Não havia água escorrendo pelas paredes, contudo, tinha a sensação de que havia um lago correndo à sua volta. Dionísio torna a mira os quadros.
– Ouvi falar que foi do Mestre Furher a ideia de por o quadro dos mestres aqui.
– Furher? – Dionísio pensa um pouco e se recorda – Ah, lembrei. É o tal mestre que enlouqueceu. Que estava internado no manicômio judiciário.
– Esse mesmo – disse Cravo.
Sílvio se entristece ao ouvir os dois se referirem a Ernesto.
Dionísio, ainda com a atenção fixa nos quadros, dá um giro e vê que um era o maior de todos eles. Diferente dos outros, esse aparentava ter mais de cem anos. Era a figura de um homem de mais ou menos sessenta anos, bigode longo e grosso cujas pontas grisalhas eram dobradas para cima. Usava trajes finos e antigos e tinha uma fisionomia respeitável.
– Quem será esse? – indagou Dionísio.
– Ele é o Barão de Januária – respondeu Cravo.
Dionísio o encara espantado.
– Por que o quadro dele é o maior de todos e mais antigo?
Sílvio Koren, com a ajuda do seu apoio, aproxima-se a passos lentos e responde: – Meu nobre amigo, Nessahem foi o grande idealizador do lugar, e o primeiro dos mestres, mas... – os dois o fitam com uma expressão de curiosidade
– Essas paredes, esse teto e toda essa arquitetura por detrás dessas pinturas e apetrechos tecnológicos, já existiam bem antes de todos nós aqui nascermos.
– Verdade? Que massa! – falou Dionísio com satisfação.
– Sim, seus paspalhos. Paro por aqui, se quiser aprender mais, procurem descobrir– disse o mestre.
Sílvio segue pela galeria deixando ambos para trás. A dupla volta a observar o quadro, ainda confusos. Dionísio, pensativo, reflete sobre quantos segredos o misterioso lugar guarda e sobre o longo tempo que levará para descobrir a origem dessa enorme propriedade escondida na velha estação ferroviária. Se entristece ao se dar conta de que, em breve, terá de se desligar do lugar e tomar o seu rumo na vida. Dirigi-se ao companheiro e diz com certo pesar:
– Acredito que o ano que vem seja o último que eu frequente aqui.
Cravo mira-o de súbito, com um semblante preocupado.
– Por quê? Irá se desligar do quartel? Esta com algum problema?
– Não – respondeu ele sem muito entusiasmo. – É que eu me formo no ano que vem. Um dos meus professores do curso de administração disse que se minhas notas continuarem altas, irá me indicar para uma das melhores universidades de pós-graduação da capital.
– Que bom, cara! – felicitou o rapaz.
– Espero que dê tudo certo! – suspirou Dionísio.
O rapaz coloca a mão sobre seu ombro e diz, esboçando alegria:
– Torço muito por você!
– Obrigado! – agradeceu Dionísio.
Outra vez presta atenção na imagem dos mestres na parede como se estivesse a pedir a opinião dos mesmos sobre o seu destino. Entretanto, sabia que a resposta somente ele era capaz de dar. Não sabendo se estava feliz ou triste com o seu retorno à cidade que, tempos atrás, fora seu ambiente de pesadelos, fica em silencio, submerso no seu dilema. Como será o reencontro com seus antigos colegas de colégio, agora que está totalmente mudado? Será mesmo que está apto a perdoá-los? Pensou sobre isso, mas, sem respostas.
( Semana que vem tem o segundo : "EPÍLOGO" )
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